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Foto do escritorFabrizio Marangoni

O QUE É NATURAL PARA UMA MULHER, NEM SEMPRE É O ADEQUADO

Atualizado: 28 de ago. de 2020

Por Flavia Mitri



Aos homens, um pedido


Uma grande amiga se divorciou há pouco tempo, e manteve a guarda dos dois filhos pequenos. O pai os vê às quartas-feiras e finais semana alternados. Achei curioso como pareceu absolutamente normal ao ex-casal o acordo relacionado aos filhos, e como ela saiu feliz da decisão.


Acompanhei o desgaste pré-divórcio, o esgotamento por ter a maior parte das atribuições dos filhos caindo exclusivamente sobre ela enquanto o marido só trabalhava e sacrificava muito menos seu tempo "livre" para atender à demanda de pai. Foram anos até ela começar a questionar a desproporcionalidade da entrega. "O banco está exigindo muito do Leo. Ele não tem conseguido me ajudar muito com os meninos", repetia.


Curioso como um pai cumprir sua parte na criação, cuidado e educação dos filhos ainda pode ser visto como uma "ajuda", enquanto a mãe é vista por uma ótica completamente distinta. A expectativa é de que a devoção dela aos filhos seja absoluta.

O machismo estrutural desta relação nunca foi colocado em cheque. Sempre foi tacitamente esperado que ela sacrificasse reiteradamente questões profissionais pela família e não ter quase nenhum tempo para si. Isto sequer era questionado. O anti-natural era esperar que o pai fizesse o mesmo. "Leo trabalha muito, é o homem da casa", ouvi tantas vezes. Ela também trabalhava, mas o trabalho dela era visto como menos relevante e mais descartável, ainda que ela amasse o que fazia. Aliás, como é dura a expressão "homem da casa". Deveria apenas significar você ser um homem e você morar naquela casa, mas é carregada de um duplo sentido imbecilizante.


Resultado deste divórcio: ele seguiu sendo aclamado como um bom pai, porque vê os filhos quinzenalmente e paga a pensão acordada, "sem nunca atrasar". Agora, experimente trocar os papéis neste cenário: se ela, mãe, visse os filhos apenas a cada quinze dias, e arcasse com seus custos. Provavelmente seria vista como uma mãe fria, distante e que não cumpre o seu "devido papel." Por mais que estejamos gradualmente caminhando para uma sociedade com maior harmonia nos papéis de homens e mulheres, é inegável o desnível que ainda existe em tantas relações.


Quando era muito jovem, ouvi no meu primeiro emprego que a mulher precisa fazer uma escolha entre a maternidade e o crescimento profissional. Típico papo de corredor de escritório impensável hoje, mas que era plenamente aceitável na década de 90, quando ainda estávamos na idade da pedra em termos de igualdade de gênero. Apesar de obviamente errado, aquele diálogo me marcou de uma forma definitiva. Porque para um homem este questionamento simplesmente não existe. Ter ou não sucesso nunca é associado à paternidade ou vida pessoal, para eles é exclusivamente uma questão de estudo, oportunidade, dedicação e sorte.


Acredito genuinamente estarmos evoluindo para uma sociedade em que cenários como o do divórcio da minha amiga serão cada vez mais raros. Que gradualmente haverá pouca diferença entre pais e mães na execução dos papéis dentro de uma família. Que os níveis de entrega para conquista de sucesso profissional - e todos os sacrifícios pessoais inerentes ao processo - sejam cada vez mais homogêneos, independente de gênero. Mas, lamentavelmente, ainda há um longo caminho a seguir.


Aos homens, não quero generalizar, já que há muitos de vocês que batalham pelo mesmo cenário de igualdade. Mas há tantos ainda congelados no tempo, que perpetuam um estereótipo fadado ao fracasso, que não funcionava no passado, jamais funcionará no presente e será inconcebível no futuro. A este grupo, eu peço: sejam mais maduros. Saibam apoiar suas parceiras, mulheres, amigas, irmãs e filhas na mesma escala em que vocês são apoiados.

Entendam que o verbo "ajudar" não é aplicável a coisas que são inerentes ao papel que você executa numa relação. Por exemplo, um pai não "ajuda com os filhos", um pai assume seu papel. Da mesma forma que um homem não "ajuda em casa", mas cuida e limpa do local em que também vive.


Sejam gentis. Saibam aplaudir e admirar cada conquista e sucesso de suas parceiras. Jamais as diminuam. Sejam vocais em situações de desigualdade, não riam daquela piada machista e assumam a responsabilidade individual que cada um tem para fazer nossa sociedade um lugar melhor. Sejam íntegros e bons exemplos para seus filhos, para que eles não deem continuidade a comportamentos tóxicos. E, por fim, aprendam de uma vez por todas a não rotular uma mulher pelas suas decisões, o que veste, aonde vai, do que gosta, com quem anda ou como fala. Afinal, ela é tão livre quanto você.

Com carinho,

Flavia


Uma vida baseada em viajar, correr, comer e resgatar vira-latas, não necessariamente nesta ordem. Me mudei muito ao longo da vida, o que me fez ter raízes em todos os lugares e não ser de lugar algum. Acho que bicho é mais sábio que ser humano e ainda temos muito o que aprender com eles, sobretudo na capacidade de amar e não julgar. Advogada para pagar as contas, mas nunca fui definida pela minha profissão. Para saber amar o outro, é preciso aprender a se amar (e muito) em primeiro lugar.

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